Por Malu Jimenez
Estamos no mês de março, momento histórico de luta do feminismo, momento para lembrar que muitas de nós, morreram e morrem como resultado do cistema – cisheteropatriarcalcolonialista, que considera mulheres como seres inferiores, hierarquizados, fetichizados, somos as que carregam o fardo de manter tudo na “ordem” para que os homens possam viver.
Ainda hoje não somos donas dos nossos corpos, somos violentadas, humilhadas, assassinadas e culpabilizadas pelas roupas que vestimos, e não importa socialmente o quão isso é violento, nem com nossas histórias, vidas, planos, famílias…
Ser mulher no mundo é correr o risco, a cada minuto, de sofrer algum tipo de violência, é criar estratégias de sobrevivência, e isso é exaustivo, doentio.

Contudo, ser uma MULHER GORDA é multiplicar todas essas dores, é estar mais abaixo ainda desse entendimento, do que significa ser mulher, mesmo que se considere a MULHER, como disse, um ser inferior aos demais (homens), a mulher GORDA nem é considerada mulher, nem é vista como gente, nem é levada em conta…. a não ser que ela emagreça… aí sim, a sociedade revê o seu lugar no mundo, não que seja um lugar de respeito e autonomia como ser humanos, mas ainda assim é lugar mais privilegiado do que de uma mulher gorda.
Então, eu pergunto:
O que é ser uma MULHER GORDA no mundo?
É uma pergunta que lateja na minha mente há anos… O que é?
Já pensaram sobre isso?
Eu sou uma Mulher gorda no mundo, conheço muitas outras, e posso garantir que estar no lugar de lutar por existir todos os dias de nossas vidas, é ser ativista mesmo quando não se quer ser, é chorar escondido muitas noites, porque mais uma vez foi humilhada, invisibilizada… é ter inúmeros traumas a tratar, porque foi excluída de tudo que se pretendeu fazer no mundo, é estar a margem do que significa ser mulher nesse cistema.
Ser uma mulher gorda é ter que se explicar todo o tempo, andar com seus exames em-
baixo do braço para justificar quem somos, e tentar explicar que a gente só quer existir, mas sempre com um pé atrás, porque não sabemos se o tamanho de violência que vem justificada de amor e preocupação com a saúde a gente vai suportar mais uma vez, porque dói, machuca, e é muito intenso ter que lidar com isso quase todos os dias de nossas existências…

É pela saúde, é por amor, pelo nosso bem, por cuidado… A violência que rasga nossa carne, nossas subjetividades e nossa existência vem do lugar de que nós mesmas não somos capazes de nos cuidar, amar, ter tezão, escolher nossa comida, estilo de vida, praticar atividade física, ter saúde, ficar doente, nós somos vistas como uma bola imensa de gordura podre, estragada marcada por características: feias, chatas, bravas, violentas, compulsivas, doentes, preguiçosas, desiquilibradas, descontentes, assexuadas, tristes, fracassadas, nojentas.
E, portanto, merecemos ser ofendidas, diminuídas e contestadas, toda vez que dissermos alguma coisa sobre querer existir, sobreviver, nossas dores…
A denúncia a violência que sofremos nos é negada, e não só pelos homens, instituições sociais, mas infelizmente por outras mulheres que não conseguem entender como os homens que nesse mundo comandam:
que não aguentamos mais, que é preciso reivindicar respeito, que somos pessoas como qualquer outra e sabemos sobre nossas vidas, porque vivemos elas todos os dias desde que nascemos, temos histórias para contar, temos corpos para amar, temos vida para viver!

Texto publicado na Revista A LOBA, março de 2020.