Escritas Afectivas


O que fica e o que se transforma

A trajetória que nos conduziu até aqui, foi de profundos olhares e transformações. Cheguei buscando melhorar a minha escrita, sem ter a menor noção do quanto isso tudo iria me afectar. Fiz viagens por lugares escuros, quartos não visitados, sonhos interrompidos, solidão, traumas, dores, medos, ausências. Um encontro com a criança assustada, oprimida e abandonada. Verdades difíceis de se olhar. Alguns dirão, vitimismo!  Mas ninguém se arrisca a viver as verdades no meu lugar. As alegrias estão ali, mas não ocupam o mesmo lugar. A escrita que afecta, envolve corpo, mente, sensação, intuição, olhar. Um olhar atento para os laços que viraram nós. Para os nós na garganta, a falta de brilho no olhar. O sorriso forçado para enganar. Para os silêncios profundos e as vozes sem lugar. De fantasma passei a sombra. De sombra passei a reflexo, mesmo ainda não aparecendo em todos os espelhos. Para ver é preciso olhar.  Acorda sem forças para despertar. O mundo te chama, vem para fora lutar! Levanta, falsamente entusiasmada. Vai para baixo do chuveiro para ver se consegue acordar. Desperta! Você não tem tempo. Fica para depois. Fica para quando der.

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Só que esse momento nunca chega. Olha para a dor do outro, escuta o outro, raciocina a dor do outro, aconselha e deixa de se olhar. Era tudo que eu precisava.  Quando falo, me escuto! Respira fundo. Sorriso no rosto, agradecida. Fecha o portão. Dinheiro na conta que não dá para nada. Dever cumprido mesmo sob pressão. Troca o figurino e se prepara para entrar em cena, agora em outra locação. Pia, louça, a comida no fogão. Sobre a mesa um prato, um copo, um guardanapo. Solidão! Respira fundo. Levanta falsamente entusiasmada. Lava o copo, o prato. Extrema organização.

 Outra locação. Liga o ventilador, se senta à mesa a frente do computador. Música suave para se conectar. Papel em branco, borracha, caneta, lápis de cor. De olhos fechados, mergulha no profundo de si para a viagem começar. Ora baixinho pedindo para que ali possa sonhar. Um risco, dois riscos, três, a magia do se entregar. Mas agora em lugar belo e seguro. Aqui eu posso ficar. Sempre muito mais para dentro do que para fora. Este é o meu lugar. Então a arte se torna grito. O grito da liberdade. A liberdade que não é só minha, mas de todas as que estiveram onde eu estive, sem espectro, sem reflexo, SEM LUGAR!


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Emanuelle Calgaro

Manu para os íntimos. Escritora liberta, atriz, psicoterapeuta reencarnacionista, empreendedora espiritual, especialista em planejamento e gestão cultural e cinema.


 ___________________________________________________________________              Texto escrito a partir do exercício: \"Minha escrita é potência\" realizada para o encerramento da participação na Monitoria Escritas Afectivas  coordenado pela Prof. Dra. Malu Jimenez. 

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Poder transformar aquilo que te faz mal em algo criativo vem ao encontro de um trabalho do feminismo de aceitação e entendimento do próprio corpo, de muitas maneiras e buscas. Entender que as pessoas que te reprovam e não te aceitam são as que precisam de ajuda, pois se incomodam com algo e não sabem bem o porquê. “

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Este livro é resultado de sua pesquisa que teve origem em sua tese de doutorado, a qual propõe análises teóricas para investigar a estigmatização institucionalizada sob a qual os corpos gordos são colocados. Lute como uma gorda está disponível para venda e comprando por aqui você recebe uma dedicatória especial da autora