A Luta por Espaço e Voz no Debate sobre Gordofobia em Saúde

 

 A Luta por Espaço e Voz no Debate sobre Gordofobia em Saúde

Quem vê close, não vê corre. Esse ditado popular nunca fez tanto sentido pra mim como nos últimos meses. A gente olha as redes sociais, as fotos bonitas, as conquistas, mas esquece que por trás de cada vitória tem muito suor, luta e, às vezes, lágrimas. E hoje quero compartilhar com vocês os bastidores de uma das experiências mais marcantes da minha trajetória nos estudos e ativismo gordo: nossa participação no 9º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde – ABRASCO, que aconteceu em novembro de 2023, em Recife.

O tema central do evento já era potente: “Emancipação e Saúde: Decolonialidade, reparação e reconstrução crítica”. E foi nesse espaço que conseguimos propor e realizar a primeira mesa de debate sobre gordofobia pelos estudos do corpo gordo. Sim, pessoas gordas falando sobre seus próprios corpos, suas pesquisas  e suas experiências. Parece óbvio, mas acreditem: foi uma jornada árdua para chegar lá.

A Proposta: Falar Sobre Gordofobia na Saúde

A ideia da mesa “Gordofobia: violências em saúde” surgiu da necessidade urgente de trazer para o debate o atendimento precário e muitas vezes desrespeitoso que as pessoas gordas enfrentam no sistema de saúde. A gordofobia, infelizmente, ainda é uma lógica que permeia práticas médicas, dificultando tratamentos e criando barreiras que impedem a promoção da saúde para corpos gordos.

Nossa proposta era  trazer novos saberes decolonizados e questionar o paradigma da obesidade, que patologiza corpos fora de padrões normativos. Queríamos falar sobre as violências estruturais, o preconceito epistemológico e a urgência de despatologizar os corpos gordos. Além disso, destacar as resistências construídas por pessoas gordas através da arte, cultura e ativismo.

A Primeira Barreira: A Rejeição da Proposta

Quando enviamos a proposta, veio a resposta: não seria possível incluir nossa mesa porque havia muitas inscrições. Foi um balde de água fria. Mas quem me conhece sabe que eu não desisto fácil. Olhei toda a programação e percebi que não havia absolutamente nada sobre gordofobia pelos estudos do corpo gordo. Isso me indignou profundamente.

Então, comecei a mobilizar pessoas, enviei inúmeros e-mails para a organização do evento, argumentei, discuti e pedi uma revisão na seleção. Depois de muita insistência, recebemos a notícia: nossa mesa foi aprovada! Foi uma vitória suada, mas só o começo do desafio.

O Dia da Mesa: Um Encontro com Resistências

No dia da mesa, chegamos ao auditório no Centro de Biociências sob o calor típico de Recife. Encontrei um grupo de pessoas do lado de fora do auditório. Perguntei por que não estavam lá dentro no ar condicionado e ouvi relatos de que estavam se sentindo mal com o que estava sendo dito lá dentro. Entramos juntEs.

O cenário era desconfortável: um grupo majoritariamente branco e magro falando sobre “obesidade” de forma biologicista e violenta, ignorando completamente a presença das pessoas gordas ali na sala. Foi um momento difícil. Quem é gordo sabe como essas situações podem disparar gatilhos emocionais. Mas decidimos resistir.

Quando abriram para falas, levantei a mão e expus como aquela experiência tinha sido violenta. Falei sobre o desrespeito em ignorar nossa presença ali e como era urgente promover um debate mais ético e inclusivo. Uma das coordenadoras pediu desculpas, mas eu destaquei que não era só sobre desculpas – era sobre respeito, informação e dignidade.

A Nossa Voz Foi Ouvida

Depois disso, começamos nossa palestra. Aos poucos, mais pessoas foram chegando. O auditório lotou. E ali aconteceu algo mágico: entregamos uma fala potente, revolucionária e emocionante. As pessoas aplaudiram de pé. Foi um momento que nunca vou esquecer.

Toda a luta para ocupar aquele espaço fez sentido naquele instante. Foi uma prova viva de que nossas vozes importam e que é possível transformar espaços tradicionalmente excludentes em lugares de acolhimento e resistência.

Essa experiência me ensinou muito sobre persistência e sobre como é importante ocupar espaços onde nossas vozes ainda são silenciadas ou ignoradas. A luta contra a gordofobia é diária, mas momentos como esse renovam nossa força e mostram que estamos no caminho certo.

Ali, naquelas palmas e o auditório lotado tudo fez sentido, por toda luta, insistência, violência que passamos para ocupar aquele espaço, aquela fala, aquele encontro!

 

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Poder transformar aquilo que te faz mal em algo criativo vem ao encontro de um trabalho do feminismo de aceitação e entendimento do próprio corpo, de muitas maneiras e buscas. Entender que as pessoas que te reprovam e não te aceitam são as que precisam de ajuda, pois se incomodam com algo e não sabem bem o porquê. “

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Este livro é resultado de sua pesquisa que teve origem em sua tese de doutorado, a qual propõe análises teóricas para investigar a estigmatização institucionalizada sob a qual os corpos gordos são colocados. Lute como uma gorda está disponível para venda e comprando por aqui você recebe uma dedicatória especial da autora