Por Malu Jimenez
Durante muitos séculos, na verdade em toda a história da humanidade, as mulheres nunca foram ouvidas, nossas histórias sempre são contadas por homens brancos, europeus, dentro do sistema cisheteronormativo colonial de conquista do poder do saber. Quem conta a história é que detém a verdade, e isso acontece até hoje.
A história das bruxas, por exemplo, contada por homens, enalteceu os senhores que nos matavam queimadas em fogueiras em praças públicas e depreciavam o feminino como diabólico e perigoso, ou seja, quem estavam sendo assassinadas, torturadas por serem feministas. Já que, morrer queimada pelo sistema ao meu ver são muito mais invisibilizadas do que perigosas.
Conto essa história como ilustração, do que esse sistema que sempre é detentor da história, e não só conta, escreve, mas essa interpretação é a vigente, propagada, aliciada e apoiada por instituições de poder, como a educação nas escolas e universidades, a saúde nas clínicas e hospitais, bem como as grandes mídias, nas tvs e jornais do nosso mundo contemporâneo.
A propagação das histórias do “povo”, das “mulheres”, dos subalternos, sempre é contada por e para perspectivas violentas, que rebaixam corporeidades. Nós do outro lado reivindicamos sermos ouvidas, lutamos por colocar nossa história no mundo. Aliás para mim, essa luta é tema central no feminismo, seja ele qual for, de onde for.
Nossas histórias importam!
Pois, é isso que as feministas fazem desde de sempre, denunciam esse projeto cisheteronormativo de conhecimento injusto e segregador, que conta a história e faz ciência, produz conhecimento apoiando o lado opressor, injusto e masculino que compõem nosso mundo.
E, é por essa injustiça histórica com os subalternizados, que precisamos do poder das escritas femininas e de como seus saberes são construídos, para que possamos ter força e esperança para lutar contra a hegemonia que tanto nos invisibilizou e continua tentando nos calar.
É preciso perspectivas subjetivas femininas em nossas escritas, muito mais versões de mundo como sujeitas ativas e com políticas de escritas potentes reivindicando autoridade na construção do conhecimento.
É essencial fomentar, apoiar, consumir e propagar histórias de mulheres, como nomeia Dona Haraway, mulheres que desenvolvam, construam tecnologias da escrita como “aparato da produção literária,” para que a história não continue contada apenas pelo opressor.
Consultar
ANZALDÚA, Glória. Falando em línguas: uma carta para as mulheres escritoras do terceiro mundo. ESTUDOS FEMINISTAS, 2020. Pgs. 229-236.
EVARISTO, C. Da representação à auto-apresentação da Mulher Negra na Literatura
Brasileira. PALMARES – Cultura afro-brasileira, Brasília, p. 52/56.
HARAWAY, Donna. Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, Campinas, SP, n. 5, p. 7–41, 2009. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/1773. Acesso em: 4 fev. 2021.
FOUCAULT, Michel. Uma estética da existência. In: MOTTA, Manoel Barros (org.). Ética, sexualidade, política. 2ªed, Rio de Janeiro: Universitária, 2010b, pp. 288-93.
RIBEIRO, Djalma. O que é lugar de fala. Belo Horizonte – MG: Letramento, 2017.
SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar? Trad. Sandra Regina G. Almeida e Marcos P. Feitosandré Feitosa. Belo Horizonte – MG: UFMG, 2014.
Esse texto foi publicado no BLOG TODAS FRIDAS em 2021.